Giane Kublitski

O ATO DE APREENDER AO ENSINAR: A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E O DESENVOLVIMENTO DA CONSCIÊNCIA HISTÓRICA

Giane Kublitski



A concepção de história deve estar diretamente relacionada com o ensino, bem como o posicionamento do professor dentro e fora de sala de aula.  A prática  de um professor sempre deve ser avaliada e revista de forma que sempre possa ser aprimorada. O posicionamento frente aos alunos e frente à sociedade como um todo pode dizer muito sobre a sua prática como profissional da educação. Neste sentido  é feita a discussão da valorização dos professores relatada pelo o autor Paulo Freire  que aponta:

De um lado, evitar uma compreensão distorcida da tarefa profissional da professora, de outro, revelar a sombra ideológica repousando manhosamente na intimidade da falsa identificação. Identificar professora com tia, o que foi e vem sendo ainda enfatizado, sobretudo na rede privada em todo o país, quase como proclamar que professoras, como boas tias, não devem brigar, não devem rebelar-se, não devem fazer greve (FREIRE, 1997, p. 9).

Dessa forma a crítica da sociedade aos (as) professores (as) não é para contribuir para que os mesmos avaliem sua prática docente, e procurem melhorar em sala de aula, a crítica acontece no sentido de derrubar, demonstrar que as "tias" não podem abandonar seus supostos sobrinhos para lutar pelos seus direitos. Neste sentido discutiremos nesse texto o desenvolvimento da consciência histórica de nossos estudantes. Ao refletirmos nossas experiências podemos chegar a consciência histórica e aprimorara-la de forma a chegar a perceber o mundo de outras maneiras, podendo assim interferir na vida prática. Dessa forma toda pessoa sabe algo ou vivenciou algum tipo de experiência, e dela agregou algo mesmo que essas experiências não tenham sido boas elas trazem para  a pessoa uma concepção do que se viveu. Essa experiência é a bagagem histórica que  todos os homens e mulheres  possuem em menor ou maior escala.

Paulo Freire discute a consciência crítica assim como o autor Jörn Rüsen, o qual acredita que  ela se apresenta da seguinte maneira:

O passado oferece a experiência de que necessita para orientar-se no presente e para desenvolver uma sólida perspectiva de futuro. "Essa experiência faz sentido quando pode ser utilizada para a configuração da própria vida" (RÜSEN, 2001, p. 10).

O sentido que a ciência da história tem em nossa vida prática é a pergunta que sempre ouvimos de nossos (as) alunos (as), e para que serve estudar algo que já passou? A história é vista como a ciência que serve para dar aos seres humanos uma orientação do que foi o passado, e dessa forma pensar o futuro, e mais do que isso ela tem uma didática da qual faz uso para se apresentar aplicável, se utilizando da consciência histórica que cada indivíduo tem para contribuir dessa forma para ser uma ciência que busca desenvolver sujeitos críticos. "A história nos faz compreender o presente, explicando- nos onde for possível, as origens do atual estado das coisas (DROYSEN, 2009, p. 10). Assim Droysen apresenta o sentido que a história tem para a vida prática.

Droysen foi uma das inspirações de Jörn Rüsen que é muito usado para se  apresentar a questão da história e  a sua aplicabilidade. Rüsen (2007, p.10) coloca que a história é o "passado compreendido, presente problematizado e futuro perspectivado" segundo Rüsen quando nos atemos ao passado, compreendemos o que se passa no presente, dessa forma o passado nos mostra que o futuro pode nos reservar. Não entendamos a história então como uma ciência que prevê o futuro a partir do passado, mas com uma ciência que nos dá dimensão do que poderá vir apresentar-se, se analisarmos o que se deu no passado. Rüsen nos apresenta então a consciência histórica que se agrega aos indivíduos pela sua cultura e pela vivência e suas experiências.  Com base nessas análises podemos concluir que a escola é um espaço social onde há mais do que estudo. Existe nesse espaço um contexto de aprendizagem que vai além do quadro negro, porém seu papel ainda é educar para tornar os (as) alunos (as) seres sociais e explorar a sua consciência histórica, e torná-la mais ampla e crítica.  Neste espaço descrevemos nossa experiência de estágio, e fusão de teoria e prática.

Os estágios aconteceram do dia 22/07/2015 ao dia 14/08/2015, no Colégio Estadual Afonso Alves de Camargo Ensino Fundamental e Médio. Trabalhei com uma turma do 8º ano a qual tinha 37 alunos. Meu estágio foi supervisionado pela Prof.ª  Jussara R. Cordeiro, e teve como tema a Revolução Industrial. O colégio tem boa estrutura, pois foi recentemente reformado. Tem quadra coberta, refeitório, biblioteca, laboratório de informática, porém acredito que uma escola não se faz somente com estrutura física, mas principalmente com a valorização das pessoas que frequentam esse prédio, como professores (as) alunos (as) e funcionários (as). Dessa forma entendo que não adianta estrutura física se os profissionais que lá atuam estão desmotivados e cansados de tanto desrespeito. O desrespeito é uma reação em cadeia, de modo que professores (as) e funcionários (as) cansados afetam de forma direta os estudantes. No meio disso tudo iniciei os meus estágios.

Logo nas observações percebi que meu estágio seria mais que uma experiência, seria um desafio, afinal uma turma com 37 alunos (as) adolescentes sempre é um desafio. Por ser uma turma muito grande a dispersão de atenção era inevitável, mas não os culpo, afinal de contas são jovens com toda a sua energia e disposição para gastar. A turma não tinha sérios problemas com a disciplina, com algumas exceções.

Foram 12 aulas ministradas e 8 de coparticipação com a turma. As aulas passaram por 3 horários diferentes por consequência da greve. Minhas aulas foram expositivas dialógicas, onde procurei partir sempre do conhecimento prévio dos estudantes para problematizar os questionamentos feitos por eles.

Na aula expositiva dialógica o professor toma como ponto de partida a experiência dos alunos relacionada com o assunto em estudo. Os conhecimentos apresentados pelo professor são questionados e redes cobertos pelos alunos a partir do confronto com a realidade conhecida. Ao contrário do que ocorre na aula expositiva tradicional, a aula expositiva dialógica valoriza a vivência dos alunos, seu conhecimento do concreto, e busca relacionar esses conhecimentos prévios com o assunto a ser estudado. O fundamento dessa nova dimensão da técnica é que somente partindo-se do concreto é possível chegar a uma compreensão rigorosa da realidade.  (FREIRE E SHOR apud LOPES, 1991, p. 43.)

Diversos foram os fatores que dificultaram o acesso à turma que eu lecionei. Vou aqui citar dois pontos. Muitos estudantes em uma mesma sala facilitava que se dispersassem com frequência. Enquanto dois queriam prestar atenção os demais estavam fazendo qualquer outra coisa que não fosse estudar. Havia ali alunos com uma capacidade enorme, também alunos muito dedicados, porém uma turma tão grande uniu alguns estudantes que precisavam de uma atenção especial e com a falta de atenção que recebiam, as suas capacidades ficavam de lado e esquecidas.  Eu não conhecia os alunos, nem suas vidas pessoais, mas ao propor uma tarefa pude perceber a dificuldade que cada um passava. A atividade era analisar uma tirinha e responder algumas questões (quanto tempo você gasta para chegar a escola? que programas de televisão você assiste? que horas acorda?). Quando li as respostas entendi que a vida de alguns já era bastante difícil e a escola era somente  mais um lugar que  deviam estar.

A questão que eu quero levantar aqui é até que ponto a indisciplina dos nossos estudantes pode ser assim considerada. Segundo o texto  de Julio R. Groppa Aquino,

Decorrer disto que, apesar de o manejo disciplinar ter sempre estado em foco de um modo ou outro nas preocupações dos educadores, o que teria acontecido com as práticas escolares a ponto de a indisciplina ter se tornado um obstáculo pedagógico propriamente?  Nossos antecessores talvez nunca tenham cogitado isto, uma vez que as prescrições disciplinares eram consideradas uma decorrência inequívoca do exercício  docente . Ora, o mundo mudou, nossos alunos mudaram.  Mudou a escola?  Mudamos nós? Estas tantas questões nos levam, enfim, a considerar a indisciplina como sintoma de outra ordem que não a estritamente escolar, mas que surte no interior da relação educativa. Ou seja, ela não existiria como algo em si, um vento pedagógico particular, e no caso, antinatural ou desviante do trabalho  escolar. (AQUINO, 1996. p. 41).

Essa  falta de interesse por parte dos estudantes pode ocorrer por diversos fatores, esse é um problema recorrente de nossas escolas nos dias atuais,  muitas vezes os (as) alunos (a) que precisam de mais atenção e que tem algum tipo de dificuldades de aprendizado, são tratados por diversas vezes como alunos (as) indisciplinados, porém o que não se percebe é que é preciso uma nova forma de avaliar essa indisciplina, para que ela não prejudique o (a) aluno (a) na hora do aprendizado. Também é preciso perceber  que nossos (as) alunos (as) tem acesso a um mundo diferente dos murros da escola e é preciso levar esse mundo  em consideração na hora de ensinar.

Segundo Rüsen, (2007) o desenvolvimento da consciência histórica se dá quando partimos do que sabemos para que então essas experiências nos levem a aprimorar nossa consciência histórica e crítica. Mesmo sabendo de tudo isso em diversos momentos deixei que meu lado mais autoritário falasse mais alto. Tudo isso no fim serviu para que eu reavaliasse minha prática como profissional da educação, se defendo que não posso ser uma "tia" da educação, também não posso exigir dos meus (minhas) alunos (as) que eles (as) também fiquem inertes aos problemas que estão a sua volta, sejam esses problemas de cunho familiar, social ou mesmo da escola e do sistema que os (as) envolve. Diante de todos os percalços apresentados no relato de experiência, temia muito pelos resultados que iria obter do estágio.  Reconheço falta de tato, mas entendo que o estágio serve realmente para que se possa rever e compreender nossa postura como professor (a) e dessa forma aprimorar minha atuação. A maior dificuldade que senti como professora foi de me aproximar dos estudantes, pois durante todo meu estágio  a antipatia da turma com relação ao tema e também a mim era visível, talvez por isso as aulas não fluíram como eu esperava que fosse  acontecer  nas  três primeiras aulas  não consegui atrair o interesse deles para o tema. Nem mesmo os filmes que eu passei chamaram atenção deles.  Porém, algo ainda mais complicado é avaliar  essa é uma tarefa extremamente difícil, e que requer muito  profissionalismo, sensibilidade e cuidado do (da) professor (a) para não cometer erros que podem mudar a trajetória dos estudantes.  Avaliar segundo as Diretrizes Curriculares do Paraná é compreender que "avaliação não é o ato final de um aprendizado uma atividade avaliativa representa, tão somente, um determinado momento e não todo o processo de ensino - aprendizado." (PARANÁ, 2008, p 32).
E diante das atividades percebi o verdadeiro do desenvolvimento da consciência histórica e do papel do (a) professor (a).

A resposta me fez perceber que o desenvolvimento da consciência histórica que relatamos acontece a partir de elementos diferentes. A sensibilidade de fazer com que os (as) nossos (as) coloquem no papel suas próprias experiências e que não decorem termos e conceitos e repitam tudo rigorosamente, é a maior dificuldade de  educador, tirar dos (as) alunos (as) o melhor deles  sem deixar de lado suas vivências e memórias fazê-los refletir, criticar e  argumentar é algo muito complicado e ao mesmo tempo prazeroso.  Diante dessas considerações pude perceber que o professor deve sempre reavaliar sua prática. Essa avaliação deve ocorrer de turma para turma, porque trabalhamos com pessoas que pensam e agem diferente das nossas vontades. Avaliar minha prática dentro da sala de aula me fez perceber e me questionar que tipo de consciência histórica estou pretendendo desenvolver nos (as) meus (minhas) alunos (as). E dessa forma não posso exigir que eles escrevam em uma avaliação  que contém perguntas voltadas mais para teorias sendo diferente do que  eles (elas) realmente pensam ser um processo de Revolução.

Referências     
        
AQUINO, Julio Groppa (org). Indisciplina na Escola: Alternativas teorias e práticas. São Paulo. Summus, 1996.
DROYSEN, Johann Gustav. Manual de Teoria da história. Petrópolis: Vozes, 2003.
FREIRE, Paulo, Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho d’água, 1997.
LOPES, Osima Antônia. Aula expositiva: Superando o tradicional: In: ALENCASTRO, Passos Veiga Ilma (org). Técnicas de ensino: Por que não?  Campinas - SP: Papirus, 1991.
SCHMIDT, Maria Auxiliadora. A cultura como referência para investigação sobre consciência Histórica. IN: BARCA, Isabel (org.) Educação e consciência histórica na era da globalização. Braga: Instituto da Educação, Universidade do Minho, 2011.

RÜSEN, Jörn. Reconstrução do passado. Teoria da História II: os princípios da pesquisa histórica. Tradução de Asta-Rose Alcaide; revisão técnica de Estevão de Rezende Martins. Brasília: Ed. UnB, 2007.

4 comentários:

  1. Mas como aproximar os alunos do tema, ele mesmo um tanto distante em termos temporais?
    Franciele Silva

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    1. Olá Franciele, obrigada pela pergunta.
      Em se tratando desse tema procurei fazer com os alunos percebessem o que os atinge dentro da Revolução Industrial, por que acredito que ela pode ser percebi ainda nos dias de hoje no nosso cotidiano, para isso tratei de temas como a utilização do tempo,o capitalismo temas relacionados com a vida que temos hoje, somos reféns do tempo que parece ser curto, do dinheiro da busca desenfreada por ter algo, por consumir produtos que nem sempre são tão necessários para nossa sobrevivência.Claro, que apontei outros pontas da Revolução Industrial, não coloquei esse processo somente como uma visão negativa, tentei buscar elementos que aproximasse os estudantes do tema,mas sem deixar de lado pontos,como o desenvolvimento o avanço tecnológico as possibilidades e facilidades que essas tecnologias trouxeram para nós. Porém um dos pontos que achei mais importante foi destacar a presença dos sujeitos da Revolução Industrial apontar homens e mulheres crianças, dar nome a esses sujeitos, essa foi a forma como tentei aproximar os alunas e alunos do tema , dessa forma acredito que eles puderam se enxergar dentro desse processo, tirar a impressão da Revolução Industrial ser um processo mecânico, feito somente aos moldes de maquinas e tecnologias.

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  2. Olá, boa tarde. O ensino no Brasil está com déficit, mas nós futuros professores não desistimos com facilidade.
    O maior desafio de um professor é tornar a aula interessante, conseguindo passar de forma clara e objetiva o conteúdo de suas aulas e assim obter o melhor rendimento possível. Temos muitos professores apaixonados por suas disciplinas, que amam ensinar, mas que estão desmotivados em passar o conteúdo para alunos desinteressados.
    Minha pergunta é? Com muitos professores apresentando a síndrome de Burnout, qual seria o melhor caminho para se obter um bom desempenho de alunos desinteressados sem se esgotar profissionalmente? Obrigada pela atenção!
    Ass: Juliana Myrian de Souza Rodrigues

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  3. Olá Juliana, obrigada pela pergunta.
    Acredito que nós futuros professores é que somos a mudança, somo jovens com novas visões. Sei bem que encarar uma sala de aula nos dias atuais não está sendo uma tarefa muito fácil, mas acredito de verdade que com força de vontade podemos mudar essa realidade. Como citei no texto não podemos mudar o mundo, mas fazer nossa parte dentro da sala de aula isso podemos e devemos, muitas vezes não é de uma aula magica que nossos alunos precisão, mas de um pouco de atenção e respeito por parte da escola e dos professores. Quanto os professores que sofrem de síndrome que merecem mais atenção dos governantes, um respaldo com bons médicos um bom plano de saúde digno que posso ajudar e melhorar a qualidade de vida desses guerreiros, respeito por parte da sociedade, que inclui pai, alunos e a sociedade como um todo.
    Espero ter contribuído.

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